A forma como hoje funcionam as empresas, a capacidade de retenção de dados e a velocidade com que esses dados podem ser tratados, aumentou as oportunidades para o tratamento estatístico de dados dentro das empresas. Estas oportunidades aumentaram a informação de suporte às decisões dos seus gestores e com isso a sua capacidade de decisão.
Estas oportunidades estão disponíveis em organizações de qualquer dimensão. Não há hoje pequeno escritório ou loja que não tenha um computador. Qualquer café tem um sistema de vídeo-vigilância, e basta alguns euros por mês para adquirir serviços de e-mail. Todos passíveis de serem minados para obtenção de indicadores.
As organizações podem por isso recorrer cada vez mais a estas oportunidades para otimizarem os seus consumos de serviços e ou organizar as suas atividades. A competição a isso obriga.
Nas grandes organizações, os gestores de sistemas de informação (CIO – Chief Information Officer) gerem hoje mais dados e mais meios de recolha de dados e produção de indicadores do que há 10 anos seria imaginável.
Os parques de impressão, o tráfego das redes de comunicações, os termostatos dos ares condicionados, a ocupação dos elevadores, os acessos aos meios físicos, tudo isto e muito mais tem um sistema, uma aplicação, um registo. Estes registos são quase todos informatizados.
A digitalização do trabalho substituiu grande parte da interação entre pessoas, através de plataformas eletrónicas, por relações que passam por intermediários que permitem todo o tipo de registos.
Nos sistemas de registo em que os dados não são informatizados, estes ficam hoje registados de tal forma que, com um computador e um digitalizador ligado, rapidamente são transformados. Os dados registados em letra de imprensa nas quadrículas dos formulários, mesmo que manuscritos, podem facilmente tornar-se num conjunto de dados tratável num computador.
O tratamento desses dados de forma automatizada e as interpretações que são feitas pelos gestores das normas em vigor são por isso uma preocupação crescente na defesa dos direitos dos cidadãos, em especial, dos trabalhadores.
Os trabalhadores têm uma relação de dependência muito maior da entidade patronal que outro cidadão, o que os torna vitimas fáceis de interpretações das normas de tratamento de dados.
Por essa razão, a UNI Global Union, organização que representa 20 milhões de trabalhadores em 900 sindicatos de 150 países, decidiu criar um documento orientador para a proteção dos direitos sobre os dados dos trabalhadores no local de trabalho.
Este documento procura, através de 10 princípios, endereçar o crescente desequilíbrio provocado pelo tratamento de dados no local de trabalho. O documento apresenta assim o conjunto de reivindicações que os trabalhadores mundiais devem fazer para proteger os seus direitos.
Estes 10 princípios apontam para os direitos de proteção de dados dos trabalhadores, de forma independente e com capacidade de exigência de explicação da forma e dos fins para que os dados são processados, com direito de acesso e influência sobre os dados colecionados sobre os trabalhadores, pelo próprio trabalhador e pelas organizações representativas dos trabalhadores (ORT).
Nada disto deveria ser novo, tendo em conta o Regulamento Geral de Proteção de Dados (RGPD) que, muito em breve, por via da sua aplicação direta no nosso país, passará a permitir a aplicação de multas avultadas a quem não o cumpra.
Mas de pouco vale a um trabalhador a deteção e julgamento a seu favor de um erro de tratamento de dados por uma entidade patronal. Depois de os seus dados serem utilizados para além dos objetivos para os quais foi permitida a recolha, não haverá fanfarra ou registo publicitado do erro cometido pela entidade patronal.
Terão por isso de ser os trabalhadores a fazer valer estes direitos antes dos incidentes. Terão de fazê-lo com a introdução destes princípios nas negociações coletivas e através do controlo constante da aplicação dos direitos que aí adquiram.
Como cidadãos temos de estar vigilantes na defesa dos nossos direitos. Como trabalhadores ainda mais.
(Texto de opinião publicado no Acção Socialista – 16 de fevereiro de 2018)