Asfixia democrática

asfixia

A oposição em peso fez-se à estrada para acusar tudo e todos os que estivessem ligados ao Governo de mentirosos.

E com isto puseram em causa todos os profissionais e técnicos que, não sendo do Governo, trabalham para o Estado ou para empresas, isto é: todos nós.

Pedem-nos que coloquemos em causa:

  • Os trabalhadores da Segurança Social por atribuirem subsídios a quem não quer trabalhar;
  • Os técnicos do Instituto Nacional de Estatística por fazer as contas ao desemprego da mesma forma que o Eurostat;
  • As policias, por não prenderem e por prenderem;
  • Comissão Nacional de Eleições por não impedir Governo de fazer inaugurações;
  • Tribunais e Ministério Público por não implicarem directa José Sócrates no caso Freeport;
  • Os Administradores da TVI, porque queriam mandar na empresa deles.

Mas quem faz estas acusações não é qualquer um, mas aqueles que querem vir a ser Deputados da Assembleia da República.

Existe asfixia democrática quando os eleitos da nação não acreditam no principio da inocência.

Existe asfixia democrática quando pessoas que se candidatam a cargos públicos põem em causa os meios e aqueles que se propõem a governar.

O que aprendi com Manuela Ferreira Leite

Grande Entrevista - 2009-08-20 - Manuela Ferreira Leite

Com a entrevista de Manuela Ferreira Leite ontem na RTP e com o que disse até agora aprendi várias coisas que passarão a fazer parte da minha formação:

  1. Posso dizer que não tenho informação suficiente para propor os meus objectivos, mas acusar o meu opositor de não ir conseguir o que ele já se propôs fazer;
  2. Quando chegar a uma posição de poder, devo acabar com qualquer voz que não esteja de acordo com o que eu digo;
  3. Para calar os meus opositores mais vocais, uma vez que não posso fazer-lhes concessões a eles por ficar politicamente fragilizado, concedo aos seus familiares;
  4. Porque não posso falar com ligeireza dos casos menos claros dos meus colaboradores mais próximos, recuso-me a comentar os dos meus adversários;
  5. Se me pedirem um programa de governo para 4 anos, recuso-o até à última hora e ameaço entregar apenas uma folha A4.

Realmente no meio disto tudo parece-me lamentável é:

  1. Que aos funcionários públicos que dependem hierarquicamente do poder político seja exigido o estabelecimento e cumprimento de objectivos num meio que não controlam a iniciativa ou ambiente em que terão de os cumprir.
  2. Que se acuse Portugal de estar asfixiado democraticamente, mas seja o próprio inquisidor fechar a boca de quem democraticamente se pronuncia.
  3. Que quem se recusa a formar governo para garantir o funcionamento do país, admita formar listas com familiares dos seus opositores para garantir o seu sossego.
  4. Que quem acusa alguém que nem foi indiciado pessoalmente, mantenha quem se recuse a prestar provas períciais em caso em que está indiciado.
  5. Que um politico não entenda que é a nós que têm de prestar contas e nos trate com sobranceria e ameaças de nada fazer até lhe ser dado o cheque branco.

Serviço Público

O debate do dia vai estar muito em breve em saber se os canais de televisão prestam ou não serviço público e o cumprem ou não, e se o fazendo, cumprem com a lei. A silly season predispor-se-á a isto e a muito mais.

Mais uma vez José Pacheco Pereira vem interceder por nós simples mortais, agora com a preocupação de querer salvaguardar os politicos de primeira de todos os proto-presidentes de junta que queiram tempo de antena nos meios de comunicação social.

A resposta não se fez esperar e foi directamente do produtor ao consumidor: uma vogal do concelho regulador, a Prof. Doutora Maria Estrela Ramos Serrano Caleiro fez questão de lhe dar pessoalmente com a luva branca, mas vai tarde pois a blogocoisa já pegou na deixa e segue para a sillyseason a todo o pano.

A ERC (Entidade Reguladora para a Comunicação Social) veio assim vincar onde a discussão será centrada, com a preocupação da salvaguarda da democracia pela igualdade de acesso à pluralidade de ideologias politicas em período de eleições através da directiva 2/2009 de 30 de Julho (PDF).

A lei consagra o estatuto de utilidade pública a instituições tão dispares (não confundir com disparates) como a igreja e os clubes de futebol e por isso à Comunicação Social, e principalmente às televisões, pelo seu poder natural, não chegará ser útil. Têm também de ser justas e isentas.

O verdadeiro serviço público que as televisões prestam neste momento é o de afastar as pessoas da utilização passiva da caixa e empurrá-las para as actividades mais sociais, como a troca de ideias mais simples e em 140 caractéres no Twitter, mas também por trocas mais aprofundadas nos blogs e mesmo nas colunas de opinião dos jornais impressos. A discussão no Twitter em torno do Prós-e-Contras é exemplo disso.

Mas da discussão sobre o serviço público e da televisão do estado nada de bom sairá para os telespectadores ou para os quadros da televisão pública se as partes, quero dizer os interessados, instrumentalizarem os canais de televisão concedendo espaço de opinião desequilibradamente.

O perigo será o aparecimento de novas cabeças pensantes que tentarão mais uma vez a teoria da privatização de mais um serviço público.

No meio das desigualdades de tratamento dos canais privados voltaremos a ter certamente a discussão se a RTP deve ou não ser privatizada, removida a publicidade e outros para criar a fumaça que apagará da memória as incorrecções desses canais privados.

  • Se optarem pela opção de retirar a publicidade à RTP, preparem-se pois que pelo dinheiro que se passará a poder pagar aos colaboradores na emissora pública, terão de pôr a Amiga Olga Cardoso para apresentar a Praça da Alegria.
  • Se por outro lado se rifar a RTP aos privados, eliminando totalmente o canal generalista, podemos ter de seguro que a guerra de audiências vai subir de tom, pois que havendo o share de publicidade do canal público para dividir entre os privados, haverá dinheiro para mais programas de qualidade duvidosa.

Para a história ficam os marcos de qualidade de conteúdos como o BigBrother e o Masterplan com que os canais privados nos premiaram.

A discussão voltará, vos garanto, e mais uma vez teremos as barricadas levantadas:

  • Por um lado os intelectuais de esquerda, a que agora chamam esquerda do caviar, fingindo estar do lado dos funcionários e dos cidadãos da RTP, que têm na televisão pública o único cliente certo das suas produtoras caducas com filmes tipo “Branca de Neve”.
  • No canto oposto do ringue teremos as empresas privadas e os seus delfins, estes dizendo estar também do lado do cidadão e dando conta dos excessos das anteriores direcções da estação pública feitos com os dinheiros dos seus concidadãos.

E nada mais natural numa guerra do que matar o mensageiro por não se gostar do teor da mensagem.

A Silly Season este ano já começou

Este ano a silly season será em grande. Com o número de fogos florestais reduzidos em relação ao anos anteriores, redacções jornalísticas serão obrigadas a puxar pela imaginação.

Hoje a Sic Noticias apresentava uma peça sobre os hobbies dos nossos políticos. Amanhã espero que não nos venham dizer o que eles comem ou onde se penteiam.

A lista este verão ameaça começar cedo a crescer, como regista a o Mar Caustico, e Alberto João Jardim não quer deixar de marcar presença.

O problema da silly season não é a falta de noticias dignas de primeira página, mas o que ela revela. Em meu entender algumas redacções sofrem de um excesso de copy and paste de todos os factos políticos gerados pelas afirmações dos políticos portugueses.

Quando os políticos metem férias, só os incêndios e as praias fazem notícia. As redacções não deveriam estar tão dependentes de leads e investir alguma coisa na investigação.

A silly season não me preocupa só a mim, mas a outros que conseguem entender o que ela esconde.

A falta de notícias politicas, sempre geradas pelas várias personalidades a disputar a ribalta, têm de ser substituídas, mas não por coisas que se assemelham a textos de revistas cor-de-rosa, onde se fala de tudo o que sirva para esconder as dificuldades.

Das dificuldades, essas, habituadas a saber delas apenas pelos políticos, as redacções terão que se esforçar em apresentá-las, mesmo porque os políticos também precisam de férias e escrever para as redações dá sempre muito trabalho.

Corninhos e coisas tratadas de outra maneira

Bancada dos Jornalistas na Assembleia da RépublicaO Debate do Estado da Nação ficou marcado mais uma vez pela habitual troca de mimos entre Deputados.

Tivemos neste debate teimas entre Rangel e o Presidente da Assembleia em que uma interpelação à mesa sobre o decorrer dos trabalhos se transformou em discurso e trocas de pedidos de silêncio quando se têm a palavra entre os vários oradores.

O ponto alto foi o episódio dos corninhos feitos com os dedos pelo ex-ministro Manuel Pinho. Ainda não se percebeu muito bem se destinados a Francisco Louçã, se para a bancada do PCP.

Os piropos trocista trocados entre acusações de corrupção e manipulação, num crescendo de acusações mútuas entre PS e PSD, maus comportamentos entre todas as bancadas e a falta de educação generalizada dos que deveriam dar-nos o exemplo, apenas desviam a atenção do essencial, reservando-nos o comentário para o acessório.

Ana Drago do Bloco de Esquerda deu mesmo em tempos inicio a uma nova forma de à partes: bater na bancada e gritar durante uma sessão de trabalhos da Comissão sobre a Educação, o que espero não se torne moda.

As coisas estão tão exageradas e extremadas que já tivemos Deputados a prometer chegar a vias de facto.

Esta actuação daqueles que deveriam ser o exemplo para a Nação, deixa no ar um não sei o quê que faz lembrar aqueles tempos de escola em que os colegas cheiravam em torno dos colarinhos uns dos outros para descobrir quem tinha empestado a atmosfera.

Somos um grupo de descontentes não porque cheire mal de verdade, mas porque alguém com menos rigor se encontra em estado de histeria aos urros e apitos no meio da praça pública a apontar o dedo sem ter de provar.

O pior cenário é o que agora assistimos, em que os herdeiros dos revolucionários de Abril mascaram de liberdade as calúnias em que suportam o seu status politico.

Esperemos que os métodos que transformaram no que é hoje o futebol português não se convertam na nossa politica, transformando-a em algo tão nefastamente extremista e religioso como é hoje um desafio de futebol, em que não interessa se está correcto, mas sim que clube prejudica ou não beneficia.

No pior cenário, um programa que passaria a fazer furor seria algo do tipo “Domingo Político” com os melhores insultos da semana e a discussão das polémicas mais acesas.

Os comentadores podiam ser os mesmos, com todo o respeito que lhes é devido:

  • Pelos tios cosmopolitas, da nova facção democrática e pluralista liberal, o nosso já conhecido comentador de tudo até romances, Pedro Santana Lopes.
  • Pelos queques rurais, da habitual facção conservadora social democrática, Francisco Seabra.
  • Pelos faciosos do norte, podiam manter o Poncio Monteiro.

“Ó Poncio, não viu que a acusação feita pelo deputado é completamente desproporcionada? Olhe para as imagens.” – afirma Santana.
“Não estou a ber nada, além disso eu num sei se as imagens são de agora ou de depois. Não se percebe nada. E mais. O Presidente da Assembleia sabe se bem de que partido é.” – responde Poncio deixando a suspeita no ar.

Isto é mais assustador quanto maiores são as parecenças. Com a ajuda de um qualquer politico acabado pode compôr-se o ramalhete muito melhor.

Mas isto desvia-nos das pergunta essenciais:

  • Afinal isto está bom ou está mau? – Fiquei sem saber.
  • Não deve estar tão bom como gostaríamos, mas está assim tão mau? – Está muito mal para os cerca de 9,3% de desempregados e para os pensionistas de piores recursos, mas aparentemente bem para os abstencionistas.

E voltamos ao inicio: Isto dá mesmo para dar mais e melhor porque se trata de um Mercedes, ou temos uma bicicleta e agora queremos ir fazer corridas para o autódromo?

De um lado temos “nós” os Deputados com acesso e tempo para analisar os números e do outro “eles” o povo que lhes delegámos o nosso poder. Parece-me que nem o “nós” sabe nem o “eles” quer saber se temos bicicleta ou carro de corridas.

Assim, de um lado o “nós” grita “Criativo”, traduza-se “Aldrabão” e do outro responde-se “Gastador”, traduza-se “Ladrão”. O “eles” comenta “esses malandros” sem perceber, mas ficando sempre com a sensação que foi enganado.

Talvez devesse haver maior rectidão entre o “nós” e o “nós”, obrigando o “nós” a provar, tal como nos tribunais, as suas acusações contra o “nós”, mas isso iria tirar o colorido e o espectáculo.

Talvez deixássemos de nos interessar, pois tal como no futebol, se acabar a polémica, perde o povo o interesse e os ódios clubisticos, baixando o fervor e a assistência.