O Natal é a quadra mais celebrada pela minha família. Não porque sejamos muito religiosos, que não somos. Fui baptizado e fiz a primeira comunhão, mas o padre depois de me dar a bolacha nunca mais me viu que aquilo sabia a bafio.
Na verdade somos ligados a um consumismozinho matreiro que alimentámos desde pequenos assistindo aos crescidos a jantar longas horas de bacalhau e azeite enquanto em prantos gritávamos em coro “”As prendas. As prendas.””
Nada que não tenha deixado mossa. E porque de mossa, a minha há-de ser num daqueles sítios que só os outros vêem, mas a dos meus irmãos é bem à vista do condutor, de preferência no capota.
Bateram ambos de frente na desorganização natalícia da família e recusam-se a compactuar com tal coisa, numa atitude de “”Quem não é por mim, é contra mim.”” e eu a habilitar-me a ficar sem prendas, pois que as deles, por mais insignificantes que fossem economicamente, eram as que sempre me tocavam mais.
Nada como uma boa confusão armada pela matriarca, para que os irmãos se deixem de falar. Não que eles tenham alguma razão para se chatearem comigo, mas a verdade é que dá mais trabalho chatearem-se com quem os pariu mas eles não escolheram.
A minha percepção é que chego a esta altura sempre com a alma hospitalizada. Seja com quem for, a culpa passa para mim, vá se lá saber porquê.
E lá fico à espera que passe a quadra da prendas para voltar à calmaria do meu lar. A vida é cheia destas coisas menores, mas na verdade é grande como mais nada.
Não sei se por as abarcar, se por ter um sentido sem sentido mas que não deixa de ser. E é com este pensamento da profundidade de uma poça de chuva que vos deixo, para um Feliz Natal e Feliz Ano Novo.