O primeiro beijo.

Acho que todos temos as nossas histórias sobre o primeiro beijo. A primeira vez, afinal de contas, é sempre um aventura. Decorria a minha fulgurante carreira de estudante da quarta classe, quando conheci a minha colega Sandra.

A Sandra foi, e afirmo-o com segurança, a única loira de olhos azul com que tive algum tipo de relacionamento afectuoso. Talvez venha daí a minha crença nas anedotas das loiras.

Mas a história é pouco complicada. Na primavera desse ano, e por viver no Algarve, como habitualmente passava os meus dias livres na praia, onde me encontrava às escondidas nas escadas laterais do restaurante da praia com a dita loira.

Trocámos juras de amor e inscrevemos os nossos votos com um pico na folha de um cacto que existia ali junto.

Os nossos encontros subiam de tom, o calor apertava, e o desejo mutuo por um beijo parecia aumentar. As cabeças aproximaram-se, os lábios tocaram-se mas logo se afastaram, como se um choque eléctrico os tivesse repelido.

Nesse dia afastámo-nos sem discutir o sucedido, mas continuámos as nossas actividades imperturbáveis. No nosso encontro seguinte, a loira cabecinha havia encontrado uma forma de aumentar a excitação. Como se a que eu sentia sem saber explicar bem não chegasse.

Sugeriu então que nos beijássemos debaixo de àgua para o podermos fazer de forma mais emocionante. Não sei se era esta a sua ideia de um beijo molhado ou se o filme “”Lagoa Azul”” a teria influenciado, mas acedi.

À primeira tentativa aquilo não correu lá muito bem. Ela engoliu um pirolito e ao vir a cima um onda fez o resto. As convulsões e tosses demoraram algo tempo, mas a rapariga recompôs-se.

Ora pareceu-me a mim então boa ideia utilizar os meus óculos de mergulho para lhe facilitar a tarefa.

Compreendem a impossibilidade de duas bocas se unirem num beijo quando uma delas está acompanhada de uma máscara de mergulho? Pois parece que nós não.

Mas as tentativas sucederam-se.

A nossa relação acabou dias mais tarde quando eu discordei dela numa questão relativa a um artigo do infame Jornal do Incrível, que afirmava que um rapaz de 8 anos tinha engravidado uma rapariga de 10. Parece que para a jovem, se estava escrito era verdade.

Na semana seguinte, quando voltei à praia onde passámos as nossas tardes juntos, a folha do cacto onde havíamos inscrito os nossos nomes havia sido selvaticamente agredida e cortada.

Disto tudo tirei duas lições para o resto da minha vida:

1º – A relações não se podem condimentar com o uso de objectos estranhos.
2º – As loiras burras nasceram assim e não há nada a fazer.

Vamos para a fila

Hoje estive na fila do IRS. (Sim, eu também pago IRS)

Bem… Não era bem uma fila.

Era uma fantástica repartição de finanças com um daqueles rolos de números em papel. No entanto as pessoas tiravam o número e iam à mesma para a fila.

Os números são usados para vários fins, sendo que um deles é supostamente para evitar que a populaça se subleve de cada vez que um utente do serviço por acaso se engana e passa para a frente de outro.

“”Desculpe, minha senhora, mas eu estava à sua frente.””

E logo mais duas ou três vozes se levantam em côro para confirmar: “”Pois estava. Este senhor chegou antes e si.””

Diz-se “”Desculpe”” pois que o povo português parece que nasceu por engano e leva o tempo todo a pedir desculpa por respirar.

Hoje, com o rolinho dos números, tivemos de arranjar outras razões para discutir.

“”O meu número já passou.”” – diz que foi a outro guiché, mas todos sabemos que foi ao café, e quando voltou tinha perdido a vez.

“”Pois, minha senhora, mas se eu a deixo passar depois tenho de deixar passar toda a gente.””, diz o funcionário enquanto um burburinho se ouve no meio dos que aguardam.

“”Por esta passa.””, informa o funcionário, condescendente e convencido do seu poderzinho, enquanto o silêncio na fila diz aquilo que ninguém quer dizer em alto, deixando o cheiro do medo de ser perseguido por fazer o que estava correcto.

O senhor funcionário excedeu aqui os poderes que lhe eram conferidos, dando a um o direito dos outros, colocando assim a saque a moral inerente ao rolinho dos números da fila de espera.

É que do alto do seu poderzinho, o senhor funcionário, abriu o precedente para que numa futura visita todas as pessoas que assistiram e se sentiram lesadas não cumpram cívica e respeitosamente com o disposto de que temos de aguardar à mesma, não necessitamos de fazer fila, mas não podemos ir ao café, ou teremos de acatar com as consequências que daí advírem.

Quando para o ano for novamente para a minha fila do IRS, e alguém por acaso deixar passar o seu número, e todo o protocolo se repetir, as vozes estarão mais iradas, porque todos os anos é a mesma coisa, mas este ano com mais frequência, e a populaça irá dizer que a culpa é de um qualquer ministro, desculpando-se o senhor funcionário de um precedente que ele próprio abriu, e ninguém vai perceber que o que é grande já antes foi pequeno.

Desta vez não há votação.

25 de Abril (Atrasado)

Queria ter sido o primeiro a falar do 25 de Abril este ano. (Mas chego tarde)

Não da revolução dos cravos, do PREC ou dos Governos que o seguiram.

Quero sim falar da liberdade que foi ganha com os cravos e com os dias que tudo herdaram.

A liberdade não dizia respeito a zonas a preto ou branco, mas sim para as zonas cinzentas a que ambos pertencem.

O que a liberdade alterou foi a possibilidade de nos exprimirmos sobre o que quiséssemos, no lugar que pretendêssemos.

Esta liberdade nada tinha a ver com a possibilidade de se desrespeitar os nossos mais velhos, as nossas instituições, os nossos tudo.

Sim, porque todos temos liberdade, significa que temos mais responsabilidade uma vez que deixámos de ter quem nos verifique os discursos e as ideias no sentido de procurar elementos passíveis de levar à subversão.

Agora não temos os censores, permitindo-nos exercer livremente a dita liberdade, no entanto a subversão continua a existir.

Que se acalmem se pensam que peço o retorno dos censores, pois não é disso que se trata.

O que peço sim, é a revisão dos sistemas de liberdades adquiridas e se verifique se na sua definição foram acrescentadas as responsabilidades.

Aparentemente, as responsabilidades que a liberdade implica são de difícil cobrança. Liberdades como a das televisões e jornais de seguirem as famílias das vitimas da negligencia grosseira de Entre Rios até aos refúgios de dor e pesar daqueles que são impotentes de dizer ou fazer.

Podem sempre os orgãos de comunicação social afirmar que apenas informam o que vêm, mas não deverão eles próprios pôr a mão na consciência no sentido de verificar que o uso da liberdade que ganharam não transcende já a deles e invade a das nossas casas em hora de jantar quando sem aviso ou respeito por horário passam imagens de massacres com seres humanos a serem mutilados, ou fantasmagorias de corpos em decomposição da ultima novela do autocarro que caiu da ponte, tão espectacularmente anunciada pelo canal de Carnaxide como “”A tragédia da ponte”” como se do novo seriado de TV se tratasse.

Os Manueis Subtis latentes que se escondem no meio de nós podem agora fazer uso da dita liberdade, capitalizando no que custou tanto a ganhar, sem que por isso tenham de pagar com a sua responsabilidade, sem que por isso possamos perseguir os cúmplices de todos os barricados, por que estes apenas contam o que vêm, desresponsabilizando-se da sua maior obrigação que é a preservação da sua liberdade.

Será que ao se dar demasiado ênfase a este tipo de desgraças não estaremos a retirar a liberdade das pessoas de ligar o receptor e não ter de passar por coisas que doutra forma poderia evitar?

Será que teremos de nos refugiar nos canais temáticos?

Aparentemente, os guardiões da nossa liberdade não se dão conta que apenas estão a dar trunfos para que homens de honra sejam obrigados a fazer o que os subversivos pretendem.

Criar leis que eles próprios deixaram de poder controlar.

Diz-se no mundo dos negócios que uma empresa que não se define em nenhum mercado acaba ela própria por ser definida por todos, sendo obrigada a refugiar-se moribunda num vão de escada.

Os orgão de comunicação social deviam rever em conjunto a sua actuação gananciosa e tentar encontrar uma maneira de não matarem a galinha dos seus ovos de ouro: A Liberdade.

Á LIBERDADE.

Como subir na vida?

Como subir na vida? E qual vida? Quer subir na vida para onde?

Geralmente diz-se “”Subir na vida”” como uma maneira de referir genéricamente alterações para melhor do Status Quo (Não é o grupo).

No entanto hoje em dia são poucos os militantes do ideal “”Trabalhar para ganhar””.

Na realidade é longa a lista do “”Dissimular e enganar para ganhar””.

Nas suas fileira estão intrincheirados o famoso “”Simpático, mas não me vires as costas””, o fabuloso “”Deixa estar que tu fazes isso e eu colho os louros”” ou mesmo, “”sou uma vitima, mas na primeira hipótese como-te vivo””.

Existe ainda a equipa do “”QPM”” (Quero-posso-e-mando), mas para fazer parte deste grupo depende-se em grande parte da ignorancia de quem realmente quer, pode e manda. Isto tudo para dizer que o país está a saque, mas não se riam os não-portuguese pois que foi na terra deles que tudo aprendemos.

Nos tempos da outra senhora dizia-se que o povo é sereno, mas hoje, o povo está mas é apático. Nada importa desde que dê o BigBrother e que a geladeira tenha cerveja.

O povo está tão sereno que já não é preciso fazer campanha politica para ser Presidente da República. Basta que se esteja presente nas listas de votos pois que o tempo de antena é uma chatice e só atrasa a novela.

A apatia foi tão grande que o acontecimento mais marcante da campanha foi mesmo não haver campanha. Naturalmente que o povo quer é que fique lá o mesmo, assim como assim já se encheu e se para lá outro for tem de se alimentar outra vez.

“”Viva Mário Soares”” dizem alguns, ainda a pensar que este é o Presidente da República.

Mas na realidade, de lá para cá pouco muda.

Está sempre lá alguém que a cada orçamento de estado pede mais 10% que no ano anterior, e no ano seguinte diz que se excedeu em 6%.

Assim sendo, para que serve o Presidente? Não era suposto ele chamar a atenção aos Governos e Assembleias que o despesismo está a sair do nosso bolso?

Parece que não, pois que quanto mais dinheiro tiverem para gastar, mais são os que têm direito a comer e menos são os que se queixam. Infelizmente parece é que a comer são sempre os mesmos e a chuchar no dedo também.

Realmente, toda a polémica sobre o nosso hino nacional à uns anos atrás não passou de um rato parido pela montanha, e se por acaso o tivessem mudado, já teriam de o estar a re-colocar uma vez que de “”Heróis do mar”” e “”Nobre povo”” nos tratamos, mas os aneis foram-se todos, e de heróis só temos a capacidade de sofrer calados, mas talvez aí o hino devesse passar a “”Mártires do mar””

Já sabem aquela…

A conversa começa sempre assim. “”… aquela da loira que…””. Acaba sempre por descambar em parvoíce e situações ridículas.

Rimo-nos do que podemos: Das loiras, dos baixos, dos gordos, dos alentejanos, dos pretos, do cigano, “”aquela do inglês, do francês e do português””, os cães, os gatos, deus e o menino Jesus, o Samora Machel e o Papa, ninguém está livre de uma boa risada.

Mas nunca oiço ninguém contar uma anedota sobre um homem normal, adulto, caucasiano, com família composta de mãe, 3 filhos, cão, piriquito e sogra acamada, pois parece que não há nada de engraçado para contar.

“”Vocês sabem aquela do gajo que chega a casa e a mulher estava na cama com o cão e os três filhos a ver o Big Brother? O cão disse que queria mudar de canal.”” – Segue-se o riso enlatado com o rufar do tambor. O absurdo das nossas vidas é que nada têm de absurdo.

É isso mesmo. Somos todos tão normais que não é normal. Normais ou normalizados, não há grande diferença.

Na realidade o ponto da situação é que normalizamos as situações para posteriormente lhes introduzirmos uma linha final de anormalidade com que nos divertimos, não nos apercebendo que nos estamos a rir da quadratura do circulo.

Quase ninguém conta anedotas com eles próprios como actores principais a não ser os palhaços.

Assim quem conta histórias em que ele próprio é o protagonista é visto como uma figura triste e pobretanas que poderá ser equiparado aos ditos.

Infelizmente é o juízo feito pelo colectivo, mas o colectivo, como todos nós sabemos é uma massa amorfa que segue as vozes mais discordantes, independentemente de estas o fazerem de forma coerente ou não.

A verdadeira capacidade de nos elevar a um estado de alma que nos deixa em concordância e felizes com nós mesmos, é a capacidade de rirmos dos nossos próprios erros e desgraças.

Essa capacidade extrovertida prova que estamos bem com nós mesmos e não que temos menos amor próprio. Naturalmente que quem conta os seus erros e desventuras em público fica exposto aos que dos erros dos outros se usam para subirem na sua carreira profissional e social.

Os verdadeiros palhaços, pobretanas e outros insultos que agora não me recorda, são os que não tem mente fecunda que baste para encontrar o lado feliz da sua vida e para pensarem que quando isto tudo passar, poderão contar aos seus as suas façanhas, aventuras e desventuras.

Uma anedota acaba então a ser uma história que por se revestir de pormenores que a tornam mais ou menos gostosa, dão mais ou menos prazer a quem a houve.

O verdadeiro contador de histórias traduz sentimentos pelo que diz, de felicidade, de tristeza, de expectativa e outros que se adaptem à causa a descrever.

O contador de anedotas traduz da história, primeiro a expectativa, depois o espanto pelo desenvolvimento menos esperado da situação em causa.

Assim rimo-nos apenas porque finalmente conseguimos aliviar a tensão e a ansiedade criada em nós pela história em si. Por isso, conte anedotas sobre si mesmo.

Não lhe traduz o “”Meaning of life””. Os Monty Pittons também não o fizeram no seu filme.

Pelo menos alivia a ansiedade que sente em relação à sua própria vida passada e futura.