Sempre são quarenta

Quarenta anos não deviam fazer qualquer diferença, mas dois filhos vieram demonstrar que fazem toda a diferença.

A barriga já faz sombra e os cabelos brancos vão aparecendo em sítios que nem vos conto. Soube que estava realmente a envelhecer quando aquela pestana branca que caiu quando me assoei não era realmente uma pestana.

A ratice vai acentado arraiais e a maneira de ser vai sendo a mesma, mas com o polimento que o tempo lhe dá.

Com a idade sinto-me cada vez com menos certezas e a necessitar de aprender mais. A única certeza que permanece é a de que no dia que souber que tenho de ir, vou ficar muito chateado de me ir embora.

Para trás vou deixar este blog com já quase 10 anos de existência, uma banda desenhada nunca publicada e o que mais conseguir fazer nos muitos anos que ainda quero cá andar.

Tive a sorte de me cruzar com quem é hoje a minha mulher. Por eu não ser tão grande homem, não significa que ela não seja uma grande mulher.

Ouvi dizer que um homem só é homem depois de construir uma casa, plantar uma àrvore, ter um filho e escrever um livro. Não sei se o cebolinho e o basilico que fui plantando para os meus cozinhados contam como a tal àrvore, mas a remodelação da minha primeira casa conta de certeza como a casa construída pois até chão assentei, coisa que prometi a mim mesmo nunca mais fazer.

Do trabalho não tenho o desafio que gostaria, que isto de ser gestor de projectos onde estou é mais sobre não fazer e controlar do que tomar iniciativas.

A idade já me permite dizer “que se lixe”, desde que não me lixem cá os horários com a mulher e as crianças. Algum dia faço pela minha mão o que ainda não me pediram e poderei voltar a dizer: “Eu fiz Isto!”

Dos amigos vou ouvindo dizer que estou apuradinho, mas a fila para os jantares cozinhados por mim nunca diminuí, demonstrativo que não envelheci salgado ou apimentado, mas apenas apurado. Apurado não: apuradinho.

No fundo, tenho a sensação que estou sempre a aprender, sempre a querer mudar, sempre a querer fazer, sempre no mesmo lugar. Talvez seja isto envelhecer.

Bibelot

A pior coisa que pode acontecer ao Natal de qualquer um é aquilo que nos acontece mesmo: alguém decidiu redecorar as nossas estantes e prateleiras ofertando-nos com… Um bibelot.

O bibelot é aquele objecto pretensamente de decorativo que nos podem oferecer no Natal. O Natal é assim um salvo conduto para que tudo o que há nas lojas e ninguém ainda tinha comprado entre lá em casa.

O bibelot é algo que se usa para tentar compor uma irremediável má escolha em decoração, numa tentativa de dar sentido a uma composição falhada, criando uma cacofonia visual onde não pode haver nenhum espaço vazio.

A desculpa de que o bibelot é um objecto de decoração, leva-me a concluir que mais decorativo só o cérebro de quem os oferece.

Quando comprei os meus moveis e prateleiras, era para lhes por as minhas coisas em cima. Aquelas coisas a que eu dou uso e não objectos de pseudo-contemplação.

Faz-me tanta falta um bibelot nos meus moveis como faz falta um gay casado com uma pessoa de outro sexo.

Bibelot é mais gay que casamentos de pessoas do mesmo sexo. É gay no sentido que é preciso ser-se um para gostar de um.

Não que eu tenha alguma coisa contra casamentos de pessoas do mesmo sexo ou gays, mas é que eu nem participo de um nem sou do outro.

Pior mesmo que bibelot, só mesmo bibelot com aspirações a objecto de arte. Um objecto de arte ganha em geral valor de mercado com o passar do tempo. O bibelot ganha pó.

O bibelot aparece sempre por trás de uma desculpa do tipo: “Não sabia bem o que oferecer…” ou “É só uma lembrançazinha…”.

O momento da oferta do bibelot transforma-se em si mesmo num paradoxo: alguém dá algo a alguém com o objectivo desse alguém saber que foi lembrado, só para que esse alguém deseje por isso ter sido esquecido.

Este Natal salvem uma estante: não ofereçam bibelots.

Aos Deputados da Nação

Já é mau que chegue que os deputados batam com a mão na bancada enquanto um Ministro fala.

Já é deselegante que baste que façam cenas de menino de escola discutindo com o Presidente da Assembleia da Republica se o que estão a fazer é ou não regimental.

Já não há nada mais que me entristeça para além de um Ministro fazer corninhos para um deputado a meio da intervenção de outro.

Já é feio um deputado chamar nomes a outro enquanto um terceiro discursa e terminarem com promessas de “vamos lá para fora”.

Já está errado uns deputados irem fazendo claque com “muito bem!” e “assim mesmo!” sempre que discursa o colega de bancada, enquanto os das bancadas opostas respondem com indignados “xiiii!” ou “mentira!”.

Já não fica bem a deputadas de uma certa idade chamar palhaço a um deputado de outra bancada.

Elevar isto tudo ao estatuto de Regimento da Assembleia da Republica ao afirmá-lo como sendo “bocas regimentais” é passar dos limites.

Mas aquilo é o quê?! Uma praça do peixe?! Uma sala de sexo ao vivo?!

Se a conduta dos representantes do povo nada tem a ver com o estatuto que se lhes atribuíu, só estamos a justificar a mudança de regime.

Tenham juízo.

Portem-se educadamente.

E não dêem razão a ninguém para assumir um poder que não é dele por falhas vossas.

Equilibrio, filhos e a cobra lá do escritório

Vivemos em competição e o país necessita de jovens preparados para renovar a sua força produtiva e para ser competitivo. Tem-se dito isto por aí.

As oportunidades são para todos, mas os recursos são finitos, daí a competição. É uma competição entre todos os que pretendem aceder aos recursos. Também se diz isto por aí.

Também existe competição pelos recursos do local de trabalho. Mas aqui a competição está desequilibrada entre os que têm responsabilidades em casa, mulher, filhos ou outros dependentes, contra os que não tem obrigações para além da sua pessoa.

Quem não tem filhos ou dependentes, não precisa de se preocupar com horários de entrada ou saída nem com horários e local de refeição. Assim fica liberto para se dedicar à competição no trabalho. Aquela que lhe dá acesso a recursos como melhores salários ou posições de maior destaque.

Todos temos um cobra lá no escritório que entra 1 minuto antes do chefe, sai 2 minutos depois e está sempre disponível com a cabeça enfiada pelo… Vocês sabem onde.

Já o disse aqui e ainda ninguém me desdisse: o sistema social de reformas da Segurança Social é o único jogo em pirâmide permitido por lei. Depende de novos contribuintes para sustentar os que se vão reformando. Os novos contribuintes são os jovens de hoje.

Este jovens de hoje, quanto melhor preparados, maior será a sua capacidade de gerar riqueza e por isso maior será a sua capacidade de contribuir para a pirâmide.

As pessoas que não têm filhos, porque têm maior capacidade de competir, têm tambem maior probabilidade de ganhar, ficando com mais recursos, mas que não re-investirão na futura força produtiva, pois não têm filhos.

Sem filhos que contribuam para sustentar a sua reforma, caberá aos filhos dos outros sustentá-los com as suas contribuições futuras.

A responsabilidade de re-estabelecer o equilíbrio fica para o Estado, como todas as outras incomodas que ninguém quer.

O Estado está numa situação difícil pois, por exemplo, as oportunidades nas empresas não são geridas pelo Estado, e assim o Estado não tem como compensar.

A legislação que poderia impedir isto seria uma que iria ser considerada descriminatoria, como por exemplo, impedir que pessoas casadas e sem filhos retirassem as mesmas vantagens das que tem filhos.

Propor que os casais homosexuais pudessem adoptar poderia equilibrar a competição.

Assim sobráva só a cobra venenosa, que nem namorado consegue arranjar, para competir pelos recursos lá no escritório.

A loucura dos quarenta

Em Janeiro celebro os meus quarenta anos de vida.

Ao contrário de outros humanos mais estereotipados do sexo masculino, não tenciono comprar uma mota e juntar-lhe uma loira com metade da minha idade.

Penso em celebrar este dia na companhia da minha mulher degustando o que de melhor haja para a mesa em Portugal e possa ser servido a um casal nos seus primeiros ‘entas:

  1. Abria com um leve e enrabichado almoço acompanhado de algum vinho branco.
  2. Passava por um lanche de pratitos de ovinhas e orelha de porco bem aportuguesados e acompanhados de umas ‘jolas fresquinhas e desprovidas de preconceitos.
  3. Fechava num restaurante japonês de escolha para me encher de Sushi até deitar por fora.

Por outro lado, a ideia de fazer uma festa de partir a moca não deixa de fazer sentido na minha cabeça. Afinal é a partir dos quarenta que:

  • Pagamos a conta pelas nossas acções e decisões passadas;
  • Perdemos a rigeza física que até aí nos caracterizou;
  • Passamos de jovens excitados com excesso hormonal a velhos porcos.

Trata-se por isso da ultima oportunidade para contrair dividas futuras com a vida enquanto ainda temos capacidade de pagar.

A falta de experiência por 20 anos de bom comportamento estão a tornar difícil imaginar mais que alguma loucuras relacionadas com bebida e stripers.

Será que é a este constante pensamento de “não sei que fazer” que chamam andropausa?