Hoje estive na fila do IRS. (Sim, eu também pago IRS)
Bem… Não era bem uma fila.
Era uma fantástica repartição de finanças com um daqueles rolos de números em papel. No entanto as pessoas tiravam o número e iam à mesma para a fila.
Os números são usados para vários fins, sendo que um deles é supostamente para evitar que a populaça se subleve de cada vez que um utente do serviço por acaso se engana e passa para a frente de outro.
“”Desculpe, minha senhora, mas eu estava à sua frente.””
E logo mais duas ou três vozes se levantam em côro para confirmar: “”Pois estava. Este senhor chegou antes e si.””
Diz-se “”Desculpe”” pois que o povo português parece que nasceu por engano e leva o tempo todo a pedir desculpa por respirar.
Hoje, com o rolinho dos números, tivemos de arranjar outras razões para discutir.
“”O meu número já passou.”” – diz que foi a outro guiché, mas todos sabemos que foi ao café, e quando voltou tinha perdido a vez.
“”Pois, minha senhora, mas se eu a deixo passar depois tenho de deixar passar toda a gente.””, diz o funcionário enquanto um burburinho se ouve no meio dos que aguardam.
“”Por esta passa.””, informa o funcionário, condescendente e convencido do seu poderzinho, enquanto o silêncio na fila diz aquilo que ninguém quer dizer em alto, deixando o cheiro do medo de ser perseguido por fazer o que estava correcto.
O senhor funcionário excedeu aqui os poderes que lhe eram conferidos, dando a um o direito dos outros, colocando assim a saque a moral inerente ao rolinho dos números da fila de espera.
É que do alto do seu poderzinho, o senhor funcionário, abriu o precedente para que numa futura visita todas as pessoas que assistiram e se sentiram lesadas não cumpram cívica e respeitosamente com o disposto de que temos de aguardar à mesma, não necessitamos de fazer fila, mas não podemos ir ao café, ou teremos de acatar com as consequências que daí advírem.
Quando para o ano for novamente para a minha fila do IRS, e alguém por acaso deixar passar o seu número, e todo o protocolo se repetir, as vozes estarão mais iradas, porque todos os anos é a mesma coisa, mas este ano com mais frequência, e a populaça irá dizer que a culpa é de um qualquer ministro, desculpando-se o senhor funcionário de um precedente que ele próprio abriu, e ninguém vai perceber que o que é grande já antes foi pequeno.
Desta vez não há votação.