O texto acima é o excerto inicial do comunicado de imprensa publicado no próprio site de um auto-intitulado Better Regulation Watchdog. Quando as organizações em que se aglomeram a Associações Voluntárias da Sociedade Civil (ver definição do Prof. José Manuel Leite Viegas de 2011 no Boletim do Núcleo Cultural da Horta, pág. 43-58 “A Participação Associativa Em Portugal: Que Contribuição Para Uma Sociedade Civil Forte.”) se juntam para criar um grupo de pressão junto dos organismos que governam a União Europeia, facilmente concluímos que até a sociedade civil sabe que em breve já pouco ou nada se poderá decidir localmente em cada aldeia-nação da Europa.
Nas Associações Voluntárias da Sociedade Civil incluem-se todas as associações em que não existe obrigação de participação. Neste grupo incluem-se organizações de ação cívica, clube desportivos, associações recreativas, organizações religiosas, sindicatos, associações profissionais, organizações patronais. Estas últimas, segundo Leite Viegas seriam as associações voluntárias de defesa de interesses e provavelmente as mais interessadas em criar um organismo deste tipo. Deparadas com incapacidade de influenciar os resultados das políticas nos seus próprios países, organizaram-se federando-se ou associando-se a organizações de dimensão europeia para se fazerem ouvir
A construção europeia tomou para os organismos centrais europeus a política de investimentos e monetária e deixou para o governos locais de cada nação as preocupações sociais e de gestão das expectativas da população local. As preocupações das organizações internacionais envolvidas neste novo Watchdog das autoridades reguladoras fazem por isso sentido. As várias pesquisas sobre a Europa demonstram que o nível de insatisfação não está controlado localmente como era esperado.
As autoridades reguladoras nacionais são organizações eminentemente técnicas. Foram incluídas no sistema do estado nação talvez com o intuito de dar continuidade ao processo de globalização europeu. A opção de nomeação vai desintegrando o modelo de representação político da democracia que depende da eleição direta dos representantes. Neste modelo, no debilitado em Portugal, os órgãos dos reguladores não são eleitos e respondem hoje mais à agenda do conselho europeu e da comissão europeia que à agenda nacional. Numa Europa que se quer mais forte, outra coisa não seria de esperar.
No sistema democrático, o organismo que faria a representação política dos cidadãos para efeitos de definição das normas seria a Assembleia da República. Com a descaracterização do modelo democrático republicano liberal de representação proporcional que orientava a democracia portuguesa, a desorganização democrática avança a galope na União Europeia para uma democracia semi-federada-coiso avec dun petite peu à lá United States. Na minha opinião, o resultado é algo tão descaracterizado que expõem claramente os problemas de deixarmos uma mudança a meio fazer.
As Associações Voluntárias da Sociedade Civil rapidamente perceberam que de pouco lhes vale peticionar junto das autoridades locais. Estamos perante uma Assembleia da República presa à disciplina partidária de voto, mesmo não estando em causa o cumprimento do programa eleitoral. Os governos são formados por nomeações sem eleitos. A União Europeia é gerida como uma federação de governos. O mais provável é vermos surgir outras iniciativas como esta.
Esta iniciativa das organizações das Associações Voluntárias da Sociedade Civil são o sintoma e não a causa da falta de confiança na democracia e nas organizações europeias. Sem representação junto dos órgãos que tomam as decisões, as associações de defesa de interesses reagem como seria de esperar.
Um antigo secretário geral de um sindicato que representava trabalhadores no regulador e nos regulados uma vez ameaçou ir pegar fogo ao prédio do regulador nacional a ver se assim já o ouviam. Parece que estamos mais perto disso acontecer e não vai ser com gasolina que vão atear a fogueira.