Quem vir a peça da SIC “Revisão do Estatuto dos Magistrados Judiciais contempla aumentos salariais ” [1], onde o sr. Manuel Ramos Soares fala, na qualidade de Presidente da Associação Sindical dos Juízes Portugueses, pode pensar que se enganou no país.
Vamos por agora fazer de conta que está tudo bem com a ideia dos representantes do órgãos de soberania se reunirem numa associação de defesa de interesse e que isso não levanta dúvidas a ninguém. Outros tratarão desse assunto [2].
Vamos focar-nos apenas nas palavras do dirigente sindical dos juízes portugueses.
Na reportagem, este representante sindical dos juízes diz coisas como:
[Em relação aos órgãos reguladores nacionais] “Esses não são para juízes. Isso são trabalhos para amigos políticos, de pessoas que estão ali seis ou sete anos a ganhar principescamente.”
[Em relação às forças armadas e de segurança]: “somos titulares de órgãos de soberania, portanto temos de ser comparados, acho eu, com os.. pessoas que exercem cargos políticos, mas com uma diferença.”
[Em relação aos cargos políticos]: “Nós não estamos nesta função 4 anos, vindos de uma profissão qualquer, e depois, saltamos para uma empresa pública ou para um trabalho no estrangeiro. Nós trabalhamos nisto 40 anos com exclusividade absoluta.”
Para o Presidente da Associação Sindical dos Juízes Portugueses, não ser nomeado politicamente e ter exclusividade absoluta por muitos anos, é o que distingue os juízes dos políticos, membros dos conselhos de administração das entidades reguladoras, forças armadas e forças de segurança
Para Manuel Ramos Soares, a titularidade de um órgão de soberania não é suficiente. Teve de acrescentar o mesmo contexto que todos os outros funcionários do estado já tem.
Pois convido o senhor Manuel Ramos Soares a analisar os estudos feitos relativos, por exemplo, às origens dos membros de cargos de representação democráticos, os quais chamou resumidamente de “cargos políticos”. Talvez assim perceba o que escapa aos aspirantes a.
Ou veja, por exemplo, a origem e formação dos membros dos conselhos de administração das Autoridades Reguladoras Nacionais. Ou a forma como são selecionados e escrutinados. De acordo com a lei, os seus órgãos são escolhidos pelos eleitos da democracia, escrutinados pelo nosso parlamento, lá está, mais eleitos pela democracia, e testados pelos regulados, os tais capitães da industria selecionados pela meritocracia dos negócios.
Ou procure informar-se sobre os assuntos e as matérias que um militar tem de saber para executar uma operação: noções de logística, leis internacionais, informação geopolítica e essas miudezas que não o afligem porque estes homens dedicaram a sua vida a proteger o sistema democrático, do qual ele representa um dos pilares, o da justíça.
Mas acima de tudo, vá ver porque é que não faz sentido um titular de um órgão da democracia jogar mão de um direito ganho para os trabalhadores para fazer valer os interesses dos titulares desses órgãos.
É que, ao contrário daqueles que representa, os trabalhadores não têm poder, nem meios financeiros, resultado dos ordenados que os seus representados ganham acima da média dos trabalhadores do país. Essa sim a razão pela qual a Constituição da República Portuguesa tem garantir proteção e permite que se unam em sindicatos para, através do coletivo, fazerem valer os seus direitos e reivindicações.
Mas acima de tudo, pergunte-se, como valoriza o povo a justiça depois de saber que os titulares dos seus órgãos se reuniram numa associação de defesa de interesses, como é um sindicato.
E já agora, se os membros da Associação Sindical dos Juízes querem é ser comparados com os… cargos políticos, responda-me a esta pergunta: então e se os políticos fizessem uma Associação Sindical dos Políticos, como ficaria o equilíbrio de que depende a democracia?
Referências:
- “Revisão do Estatuto dos Magistrados Judiciais contempla aumentos salariais” https://sicnoticias.pt/pais/2019-08-07-Revisao-do-Estatuto-dos-Magistrados-Judiciais-contempla-aumentos-salariais
- “Sindicatos de juízes deviam ser proibidos” http://4.bp.blogspot.com/_xAb1Z1hNf_s/SuisrxIeaCI/AAAAAAAAEMs/UZoWKqkO1xE/s1600-h/I.jpg